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O sepultamento definitivo dos valores oposicionistas do PT

A ética na política foi bandeira do PT na oposição, talvez a mais incisiva, em função da maneira patrimonialista como os governos usualmente tratavam a coisa pública. A denúncia constante, a fiscalização próxima, o zelo com o patrimônio público foram a tônica da oposição política feita pelo PT ao longo dos anos, Lula a frente.

Os primeiros passos do Governo Lula denotavam algum pragmatismo. De maneira mais específica, entregar o então DNER ao PL fazia tal denúncia. O episódio do mensalão foi a primeira vez que Lula deu claras pistas de que tinha assumido pragmaticamente a compra de apoio político. Sua declaração, em Paris, no auge daquela crise (“o PT só fez o que os outros partidos fazem”), além de deixar que víssemos com clareza tal opção, causava, pela primeira vez, um abalo de grandes proporções na estrutura de valores que norteava o eleitorado do PT, ainda ávido por uma nova prática política, não clientelista, não fisiológica, que repudiava a corrupção.

Naquele momento, ainda críamos nos ideais que foram sintetizados de maneira tão clara no discurso de posse de Lula:

“O combate à corrupção e a defesa da ética no trato da coisa pública serão objetivos centrais e permanentes do meu governo. É preciso enfrentar com determinação e derrotar a verdadeira cultura da impunidade que prevalece em certos setores da vida pública. Não permitiremos que a
corrupção, a sonegação e o desperdício continuem privando a população de recursos que são seus..”

O segundo mandato de Lula iniciou-se com a sombra do mensalão, mas sem, ainda, a completa assimilação desse jeito de fazer política, revelado pelo mensalão. Com o tempo, o eleitorado de Lula e do PT foi admitindo a ideia de que não há outra maneira de se fazer política. Os sucessivos episódios de corrupção foram, aos poucos, perdendo impacto no eleitorado, e deixando de produzir sustos. Assim começou a ser superada, e, por fim, enterrada, aquela noção de ética na política, na qual o corrupção era um câncer a ser extirpado. Ao contrário, o favorecimento de aliados com dinheiro público foi aceito pelo eleitorado. A compra do apoio político, ainda que isso não estivesse absolutamente claro para o eleitor, não assustava mais. A classe política já tinha feito tal assimilação anteriormente.

A eleição de Dilma seria o teste final para a vitória dessa tese: o sucesso de uma candidata sem carisma, que dependia da força do partido, e do carisma e do sucesso do Presidente, demonstraram a aceitação final do eleitorado desse modus operandi da política conduzida por Lula ao longo desses anos. Muito mais se confirma tal tese quando se verifica que o espectro das alianças do PT inclui Calheiros, Barbalho, Sarney e Collor. Não se trata de uma afirmação, feita pelos eleitores, do tipo “nós queremos que seja assim”; é mais como “não nos importa que seja assim; se assim tem que ser”. A irrefutável vitória nas urnas proclama o fim da ética na política como valor para o eleitorado. Assim, gostemos ou não, fica definitivamente sepultada a ética como valor na política – bandeira tão cara ao PT oposicionista, em favor de uma postura pragmática que primeiro foi aceita pelos políticos, e, a seguir, pelos eleitores.

Nesse particular, não cabem comparações com outros partidos, pois não se trata disso. O que se comparam são posturas ao longo do tempo: do partido (PT) e do eleitorado. Talvez seja o caso de se perder a ingenuidade de seguir lutando contra a corrupção, talvez seja o caso de se oferecer ainda mais dedicação a esse projeto.

Talvez, ainda, a questão da corrupção seja apenas um efeito colateral de bens muito maiores que virão pela frente. Mas, por mais que eu tente conceder a essa ideia um mínimo de razoabilidade, não consigo. Acho difícil que caminhos tão tortuosos possam nos levar a um porto seguro.

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